O agronegócio brasileiro é um dos pilares da economia nacional, mas em 2023 enfrentou um aumento expressivo no número de pedidos de Recuperação Judicial.
Em um ano de baixo preço das commodities e altos custos operacionais, produtores rurais e empresas relacionadas ao agro tiveram que recorrer a esse processo, para poderem se reerguer.
Quer saber mais sobre a inadimplência e o processo de Recuperação Judicial no agronegócio brasileiro? Então continue a leitura.
Neste conteúdo você vai ver
- O que é a Recuperação Judicial?
- Nova legislação para produtores rurais Pessoa Física
- O grande salto de 300%
- As maiores incidências de recuperação judicial entre os Produtores Rurais
- Estabilidade entre os produtores rurais Pessoa Jurídica
- Recorde entre as empresas “não produtoras”
- Um cenário que poderia ter sido evitado
O que é a Recuperação Judicial?
A Recuperação Judicial é um recurso utilizado por empresas em dificuldade financeira severa, que permite a suspensão e renegociação de dívidas acumuladas em um período de crise.
O processo evita o encerramento das atividades, demissões e falta de pagamentos, e tem como objetivo central apresentar aos credores um plano exequível de reestabelecimento.
Quando aprovado o plano de recuperação, a maior parte dos débitos são suspensos para que a empresa destine sua receita ao pagamento de funcionários, tributos e matérias-primas, ou seja, aquilo que for essencial para o seu funcionamento.
Assim, o requerente tem o período de dois anos para encerrar o processo, ou até mais, desde que mediante autorização judicial.
Nova legislação para produtores rurais Pessoa Física
Sancionada em 2021, a Nova Lei de Recuperação Judicial e Falência estabelece que o Produtor Rural Pessoa Física pode requerer um plano semelhante àquele destinado aos empresários.
Até então, apenas empresas de produção rural poderiam fazer o pedido. Agora, porém, produtores que desenvolvam suas atividades enquanto pessoa física também podem, com determinadas condições, solicitar a recuperação.
O grande salto de 300%
Em estudo recente sobre pedidos de recuperação judicial no agronegócio, foram analisados três grupos diferentes: Produtores Rurais Pessoa Física, Produtores Rurais Pessoa Jurídica e Empresas “não produtoras” relacionadas ao Agro.
Nele, ficou evidente o crescimento significativo entre o grupo de Pessoas Físicas, que representam a maioria dos produtores rurais no Brasil. Considerando o período entre janeiro e setembro de 2023, em relação aos 12 meses de 2022, foi registrado um aumento de 300% no número de requerimentos.
Os primeiros pedidos foram feitos logo após a sanção da lei, em 2021, e no ano passado atingiram a marca de 20 solicitações até setembro. Enquanto neste ano, no mesmo período, já foram contabilizados 80 planos de recuperação, indicando assim que os números serão ainda maiores ao fim do último trimestre.
Para Marcelo Pimenta, Head de Agronegócios da Serasa Experian, o aumento faz sentido, uma vez que a lei é recente e os produtores só agora estão aprendendo a utilizar os instrumentos da Recuperação Judicial.
As maiores incidências de recuperação judicial entre os Produtores Rurais
Entre os Produtores Rurais, houve duas classes que observaram crescimento expressivo no número de pedidos de Recuperação Judicial: os grandes produtores rurais (com mais de 15 módulos fiscais) e aqueles sem propriedade rural declarada, como os arrendatários.
Para os arrendatários, a questão é ainda mais delicada que a dos grandes produtores. Segundo o Boletim Agro da Serasa Experian, a inadimplência entre eles vem se agravando desde 2022, com um estrangulamento financeiro gerado pela combinação de custos elevados e preço das commodities em queda.
Ainda de acordo com o Boletim, foi evidenciado que, embora a inadimplência da população rural tenha diminuído no último trimestre, houve queda na média do score de crédito de 720 para 653. Uma redução sentida, principalmente, pelo segmento sem registro de cadastro rural, como arrendatários e membros de grupos econômicos ou familiares, que precisam custear o arrendamento de terras e novas safras.
Estabilidade entre os produtores rurais Pessoa Jurídica
Menor parcela da população rural, os Produtores com CNPJ vêm apresentando estabilidade no número de pedidos de Recuperação Judicial, em relação ao ano passado.
Após um crescimento ano a ano desde 2017, e maior número registrado em 2019, com 145, foi registrada uma queda gradual até 2022, quando foram requeridos 90 processos. Enquanto para 2023 é esperado um número semelhante ao do ano passado, uma vez que até setembro foram feitos 78 pedidos.
Os Estados de São Paulo, Mato Grosso, Paraná e Minas Gerais lideram essa dinâmica, associada principalmente às atividades de soja, cana-de-açúcar, café e cereais. Mas foi por meio da integração da Agrosatélite pela Serasa Experian, que a avaliação do perfil de produção pôde destacar a predominância das atividades de pastagens e pecuária, seguidas pelo cultivo de soja, cana e café.
Recorde entre as empresas “não produtoras”
Já as Empresas “Não produtoras” relacionadas ao Agro - representadas pelas indústrias de produção, revendas de insumos, agroindústrias, comércios atacadistas, serviços de apoio à agropecuária, indústrias e revendas de maquinário agrícola - bateram o recorde da série histórica em pedidos de Recuperação Judicial.
Após o pico em 2019, com 245 requerimentos, foi registrado um período de queda até 2022, quando foi atingida a marca dos 176 pedidos. Mas em 2023, o número tem aumentado em movimento semelhante ao dos produtores rurais Pessoa Jurídica, em alta acentuada recente.
Até setembro deste ano, foram registrados 263 planos de Recuperação Judicial, que representam um aumento significativo de 49%, em relação ao ano passado, número que já bate o recorde da série histórica, mesmo antes do último trimestre ser contabilizado.
Santa Catarina, Minas Gerais, Paraná e Goiás lideram em solicitações, mas o valor total das dívidas é desconhecido, uma vez que os valores das ações judiciais geralmente diferem das dívidas reais, dificultando, assim, a identificação do setor mais impactado financeiramente.
Entre o grupo, fica o destaque para a Agroindústria, o Comércio Atacadista (empresas que vendem ração, por exemplo), os setores de serviços e revendedores de insumos, que apresentaram os números mais expressivos de pedidos.
Um cenário que poderia ter sido evitado
Ao considerar o levantamento de recuperação judicial no agronegócio e as taxas de inadimplência do setor, fica evidente que o alto número de pedidos poderia ter sido antecipado pelos credores, ao identificar certos padrões nos scores de crédito dos solicitantes.
Nas análises, foi apresentado que aqueles que pediram recuperação judicial, um ano antes de fazer o pedido, já tinham um score médio de 300 pontos, o que indica um risco alto de inadimplência.
E enquanto Produtores Pessoa Jurídica apresentam um score de 450, a curva se acentua ainda mais para aqueles que são Pessoa Física, que de partida já têm um score mais baixo, apresentando significativa piora 3 meses antes de solicitar a recuperação.
Para Marcelo Pimenta, faltou aos credores uma análise mais apurada de quem eles estão colocando dentro de sua carteira, para antecipar e evitar perdas, uma vez que existam ferramentas para análise de crédito que capturam comportamentos associados a quem pede Recuperação Judicial.
No atual cenário, a expectativa é de que haja alguma estabilidade no número de pedidos, com exceção aos arrendatários, que tiveram a produtividade afetada em função da “pequena” crise climática e o atraso no plantio de soja.
O Head de Agronegócios da Serasa Experian ainda alerta: para melhores perspectivas, é fundamental que haja renegociação dos prazos das dívidas (principalmente para quem arrenda terras), e que os produtores sigam travando seus custos e receitas. Enquanto para os credores, que avaliem melhor as suas concessões através das ferramentas de análise de crédito.
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